Há quem acredite que os principais problemas da humanidade estejam
concentrados no setor público, cuja “ineficiência e lentidão” seriam
entraves para o desenvolvimento e o progresso das sociedades. A
corrupção seria outra marca desse setor, conforme o bombardeio midiático
diário que acompanha nosso dia a dia.
Enquanto isso, o grande capital “produtivo e empreendedor” segue
estendendo seus braços por todas dimensões da vida em busca de novas
mercadorias e fontes de lucro. Uma das últimas conquistas desses
desbravadores é o brócolis. Isso mesmo, o brócolis, que agora tem dono, a
saber, a gigante transnacional Monsanto.
O Escritório Europeu de Patentes, sediado em Munique, concedeu agora em junho uma patente sobre o cultivo convencional de brócolis para a Seminis, uma empresa de propriedade da Monsanto. A patente EP 1597965 contempla o “brócolis derivado do melhoramento convencional” e abrange “as plantas, as sementes e a cabeça de brócolis cortada”. Além disso, abrange uma “pluralidade de plantas de brócolis”.
Segundo um documento de trabalho publicado pela Organização Mundial de Agricultura e Alimentação (FAO), a indústria da transgenia e das sementes está planejando explorar as patentes sobre o cultivo convencional. Conforme a FAO, as vendas globais de plantas patenteadas, derivadas da reprodução convencional, devem aumenta de cerca de 700 milhões de dólares para 3 bilhões de dólares.
Considerando essa nova “conquista da Monsanto”, cabe lembrar aqui e ampliar a divulgação da carta entregue dia 25 de maio deste ano (dia em que ocorreu a Marcha Mundial contra a Monsanto) por um conjunto de entidades ambientalistas do Rio Grande do Sul ao governo do Estado.
Marcha Mundial contra a Monsanto: carta ao governador
Neste sábado, 25 de maio, milhões de cidadãos ao redor do planeta protestam na Marcha Mundial Contra a Monsanto, respondendo unificada e ativamente aos problemas sociais, econômicos e de saúde relacionados ao consumo e ao cultivo de alimentos transgênicos.
Seguido ao protesto, o movimento no Rio Grande do Sul traz duas propostas de desenvolvimento sustentável para o estado: o investimento estatal maciço em Bancos de Sementes Crioulas e a retirada imediata das sementes transgênicas do Programa Troca-Troca de Sementes da EMATER.
Por estes motivos encaminhamos hoje o presente documento, fruto de organização democrática e popular, ao Governador do RS, Tarso Genro, por intermédio do chefe do Gabinete do Governador, Ricardo Zamora; da coordenadora de educação ambiental da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Gislaine Pacheco; e do responsável pelo Plano de Sustentabilidade do Estado, Francisco Milanez.
A Monsanto é uma empresa de agricultura e biotecnologia que lucra vendendo organismos geneticamente modificados (OGM) e agrotóxicos e cobrando royalties sobre o uso de seus produtos patenteados. Entre as principais sementes produzidas e comercializadas ao redor do mundo estão milho, soja, trigo e algodão – commodities indispensáveis para a produção de alimentos em larga escala. Além da participação no agronegócio em latifúndios, a companhia também é fornecedora de insumos para a pecuária (respondendo pela criação do hormônio de crescimento bovino recombinante) e para a fabricação de comida industrializada (inventando o adoçante artificial sacarina e posteriormente comprando a criadora do aditivo alimentar aspartame).
Posto que fornece subsídios para a produção do que hoje se tornou a base alimentar do planeta,a implantação de campos de sementes transgênicas concentra para a Monsanto os benefícios da produção agrícola ao redor do mundo. Hoje, a transnacional está atrelada a 90% da produção de transgênicos no planeta e líder no mercado de sementes. Esse patamar foi adquirido com a práticas ilegais (ou legais em países com legislações frágeis) e política monopolista no fornecimento de alimentos em todo o mundo, conforme detalhado a seguir.
As sementes a que hoje temos acesso são fruto da biodiversidade de frutas, verduras, legumes e grãos criados espontaneamente pelo desenvolvimento milenar e natural dos organismos vivos. Retirando genes de outros organismos animais ou vegetais e implantando-os em sementes alimentícias, a Monsanto registra a patente deste novo gênero alimentício. Com a ajuda da monocultura, os campos substituíram espécies alimentícias locais pela lista de produtos aceitos pela indústria alimentícia internacional – e a frondosa variedade da qual goza o território brasileiro sucumbe pouco a pouco.
Os agricultores de todo o mundo que adquirem sementes transgênicas assinam um contrato em que se comprometem a repassar para a companhia uma porcentagem do lucro de sua lavoura.
O comprometimento está justificado pelo controle exclusivo sobre as sementes feito pela Monsanto, que produz e adquire as patentes das sementes geneticamente modificadas. Há suspeitas de que o suicídio de centenas de agricultores na Índia esteja relacionado à impossibilidade de saírem do endividamento com a companhia, causado pelos altos custos das sementes e dos insumos químicos necessários à plantação.
Recentemente, a empresa foi processada por centenas de produtores rurais brasileiros que requisitaram a nulidade da cobrança de porcentagem no lucro sobre a plantação de OGM. No entanto, o término do pagamento de royalties não é o único problema em questão. Pois, independente do repasse financeiro, a Monsanto se beneficia contínua e crescentemente das produções agrícolas locais por dois motivos: a dependência do campo e o enfraquecimento do solo.
Para resguardar sua fatia de mercado, a Monsanto tem adquirido recentemente bancos de sementes nativas numa estratégia preventiva frente às constantes investidas populares contrárias à cobrança de royalties pela empresa.Um movimento mundial organiza ativistas para pressionarem os representantes do governo a adicionarem dispositivos às constituições federais, visando preencher “buracos na legislação” que permitem a essas grandes empresas patentearem as variedades de plantas e os métodos tradicionais de produção de alimentos.
Proteção legislativa é o método democrático para garantir a segurança da saúde de consumidores e produtores e da economia da produção agrícola local.
A Monsanto iniciou estudos de sementes terminator (não-germináveis), isto é, que não podem se reproduzir espontaneamente – o que deixaria o produtor rural dependente da encomenda de uma nova leva de sementes a cada nova safra. Segundo Carta Aberta do CEO da Monsanto Robert B. Shapiro, a companhia não pretende e nunca comercializou sementes estéreis. Mas o depoimento de agricultores de todo o país aos movimentos sociais e a contínua encomenda de novas remessas de sementes denuncia que alguma parte desta tecnologia pode ter chegado aos campos brasileiros.
Ainda há que se dizer que a transgenia ameaças as espécies nativas. Algumas espécies de plantas têm cruzamento polinizado, o que significa que o pólen fértil de OGMs pode fecundar outras plantas distantes, transformando plantações próximas também em áreas transgênicas.
Adicionalmente, os agricultores que utilizam suas sementes e se negam a repassar parte de seus lucros, além de serem criminalizados pelos prejuízos financeiros causados à transnacional, contaminam a terra com o cultivo. Isso porque o cultivo de transgênicos está ligado ao uso intensivo de agrotóxicos. O uso de agrotóxicos – que está incluído no “pacote” da plantação de OGM – altera os ciclos naturais do solo e impacta negativamente na retroalimentação mantida pela própria produção de matéria orgânica, responsável pela fertilidade do solo. Mesmo assim, o Brasil é o campeão mundial na importação e no uso de agrotóxicos para o cultivo de alimentos. 85% da soja produzida no país é geneticamente modificada. Hoje, a soja transgênica está presente em 17 estados do Brasil, e a maior produção está no Mato Grosso do Sul, no Paraná e no Rio Grande do Sul.
São dezenas as pesquisas que indicam que consumo de OGM causa doenças. Essa combinação, segundo pesquisas científicas,provoca, em longo prazo (por isso dificilmente mapeáveis), infecções, tumores, câncer, infertilidade, destruição do sistema imunológico, resistência a antibióticos e mutação da flora intestinal.
A informação é pouca divulgada devido à intensa produção de testes patrocinados pela própria Monsanto e à imposição de barreiras a estudos que revelem os impactos dos transgênicos. As pesquisas, em geral, são de curta duração, não registrado impactos negativos nos organismos e influenciando os critérios de biossegurança dos países importadores de sementes OGM. Faltam pesquisas independentes que acompanhem os efeitos a longo prazo dos transgênicos nos organismos vivos. Os poucos estudos que conseguem ser publicados desvencilhando-se da opressão contínua da companhia de biotecnologia sobre os laboratórios de pesquisa ganham pouca visibilidade pela falta de discussão pública sobre o assunto.
Em setembro de 2012, uma pesquisa do francês Gilles-Eric Séralini foi publicada na revista científica Food and Chemical Toxicology, Este foi o estudo mais prolongado até o momento sobre os efeitos da ingestão de milho transgênico da Monsanto NK603, com e sem glifosato (um dos herbicidas mais utilizados no mundo). Os ratos de laboratório alimentados com OGM indicaram propensão radicalmente maior a mortalidade, infertilidade, desenvolvimento de tumores mamários e problemas hipofisários e renais em comparação aos outros animais. O estudo foi fortemente combatido pela companhia com forte resposta à imprensa acerca da falta de credibilidade na equipe de Séralini. Pouco tempo depois, foi admitido no comitê editorial da revista para um cargo recém criado Richard E. Goodman, que trabalhou para a empresa entre 1997 e 2004.
A empresa ainda trabalha contra a rotulagem de alimentos transgênicos. O direito de informação aos consumidores na exigência de discriminação na embalagem de produtos contendo OGM, segundo texto publicado no site da Monsanto no Brasil, “pode prejudicar a confiança dos consumidores” e adicionar um grande ônus às agências regulatórias. Uma série de estudos já revela que o problema da fome está relacionado à má distribuição de alimentos ao redor do mundo – uma consequência da especulação sobre terras e do paradigma econômico sobrepor-se ao bem-estar da população de países com menos condições financeiras. A maior prova de que a biotecnologia não diminuiu o problema, pelo contrário, só dificultou ainda mais o acesso às condições nutritivas mínimas é de que o número de famintos no mundo aumentou. Segundo a FAO, hoje mais de 1 bilhão de pessoas não têm garantido o mínimo de carboidratos necessários à boa nutrição diariamente. Desses, 65% estavam em na Índia, China, República Democrática do Congo, Bangladesh, Indonésia, Paquistão e Etiópia – países localizados em regiões produtoras de grandes estoques de alimentos transgênicos, destinados, principalmente para a engorda de rebanhos bovinos.
O uso de alimentos transgênicos atende um modelo agrícola da monocultura levando, por consequência, ao desmatamento e à contaminação das águas por agrotóxicos. Os latifúndios produtores de um único gênero alimentício têm o solo empobrecimento por desvincularem-no de outras espécies companheiras que poderiam suprir suas necessidades nutritivas. A intensificação da mecanização no campo (forte argumento do agronegócio de grande escala) tem sido uma das principais responsáveis pela fuga da mão-de-obra do campo no país.
Ao redor do mundo, Alemanha, França, Hungria, Rússia, República Tcheca e outros países já se posicionaram contrários à Monsanto e à exploração econômica dos campos por parte de outras multinacionais da biotecnologia. O movimento campesino no Haiti recusou a doação de sementes da Monsanto, depois do terremoto que abalou o país.Frente à forte oposição ativista em países da Europa, a estratégica da companhia norte-americana foi transferir o investimento em países, frágeis financeira e legislativamente, deficitários em qualificação técnica no campo e com abundância de água e de terra para desenvolvimento de latifúndios, tais como China, Índia e os latino-americanos Argentina e Brasil.
Enquanto o estado permanece calado, deixando de promover educação ambiental, melhoria da vida no campo e formação agroecológica, as grandes companhias de biotecnologia investem pesados recursos em meios de comunicação brasileiros, que são demandados para produzirem conteúdo publicitário e favorável ao uso de sementes transgênicas. Os argumentos da Monsanto são de que as sementes de OGM são mais duradouras e independentes de insumos – o que faria da transgenia uma opção sustentável – e que o lucro da propriedade rural é intensificado e o problema da fome diminuído pelo aumento da produção. Como já visto, os argumentos são falsos: os campos ficam dependentes; os seres humanos e animais, contaminados pela ingestão de alimentos geneticamente modificados; a riqueza e biodiversidade, comprometida; e os produtores rurais, reféns da empresa que fornece sementes.
Lutando contra a Monsanto, estamos lutando pela nossa comida. Ao lado dessa, outras empresas compartilham a estratégia antes descrita: Cargill, Syngenta, Bayer e suas filiais no Brasil e no mundo.
Muitos agricultores, consumidores e políticos já são contra a lógica econômica dessas organizações. Uma mudança política pode reverter o quadro e colocar novamente a soberania alimentar e a garantia de um meio ambiente sadio, direitos inalienáveis dos cidadãos, acima dos interesses econômicos de uma empresa de fins privados.
PROPOSTAS
Como sabido, a inclusão de sementes no programa Troca-Troca da EMATER foi uma medida proposta pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (FETAG-RS) e aprovada pelo conselho do Fundo Estadual de Apoio ao Desenvolvimento dos Pequenos Estabelecimentos Rurais (FEAPER). Conforme alertado anteriormente, variados problemas estão relacionados à introdução dos transgênicos nos campos. Os movimentos sociais aqui presentes requerem um posicionamento do estado que possa emitir nova sugestão e retirar as sementes dos campos da agricultura familiar – e, possivelmente, da agricultura de todo o estado.
Para alimentar a população de maneira independente, manter a produção agrícola diversificada e a mão-de-obra no campo,a reposta é investir na soberania alimentar.Nesse sentido, pedimos que o estado adote em seu Plano Estatal de Sustentabilidade o investimento em Bancos de Sementes Crioulas, que valorizem e protejam a biodiversidade local e as alternativas naturais de alimentação.
Neste sábado nos concentramos contra a Monsanto, contra o desnecessário investimento em biotecnologia frente à riqueza nutritiva e econômica natural que nossas sementes crioulas já nos oferecem. No entanto, o desejo e a implantação da transição agroecológica radical acontece todos os dias. Na confiança de um posicionamento firme e pioneiro de nosso governo e no aguardo de respostas imediatas às duas pautas previamente apresentadas, assinam este documento.
Fontes: Sul21 , Burgos Cãogrino , Ihu , La Radio Del Sur
O Escritório Europeu de Patentes, sediado em Munique, concedeu agora em junho uma patente sobre o cultivo convencional de brócolis para a Seminis, uma empresa de propriedade da Monsanto. A patente EP 1597965 contempla o “brócolis derivado do melhoramento convencional” e abrange “as plantas, as sementes e a cabeça de brócolis cortada”. Além disso, abrange uma “pluralidade de plantas de brócolis”.
Segundo um documento de trabalho publicado pela Organização Mundial de Agricultura e Alimentação (FAO), a indústria da transgenia e das sementes está planejando explorar as patentes sobre o cultivo convencional. Conforme a FAO, as vendas globais de plantas patenteadas, derivadas da reprodução convencional, devem aumenta de cerca de 700 milhões de dólares para 3 bilhões de dólares.
Considerando essa nova “conquista da Monsanto”, cabe lembrar aqui e ampliar a divulgação da carta entregue dia 25 de maio deste ano (dia em que ocorreu a Marcha Mundial contra a Monsanto) por um conjunto de entidades ambientalistas do Rio Grande do Sul ao governo do Estado.
Marcha Mundial contra a Monsanto: carta ao governador
Neste sábado, 25 de maio, milhões de cidadãos ao redor do planeta protestam na Marcha Mundial Contra a Monsanto, respondendo unificada e ativamente aos problemas sociais, econômicos e de saúde relacionados ao consumo e ao cultivo de alimentos transgênicos.
Seguido ao protesto, o movimento no Rio Grande do Sul traz duas propostas de desenvolvimento sustentável para o estado: o investimento estatal maciço em Bancos de Sementes Crioulas e a retirada imediata das sementes transgênicas do Programa Troca-Troca de Sementes da EMATER.
Por estes motivos encaminhamos hoje o presente documento, fruto de organização democrática e popular, ao Governador do RS, Tarso Genro, por intermédio do chefe do Gabinete do Governador, Ricardo Zamora; da coordenadora de educação ambiental da Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Gislaine Pacheco; e do responsável pelo Plano de Sustentabilidade do Estado, Francisco Milanez.
A Monsanto é uma empresa de agricultura e biotecnologia que lucra vendendo organismos geneticamente modificados (OGM) e agrotóxicos e cobrando royalties sobre o uso de seus produtos patenteados. Entre as principais sementes produzidas e comercializadas ao redor do mundo estão milho, soja, trigo e algodão – commodities indispensáveis para a produção de alimentos em larga escala. Além da participação no agronegócio em latifúndios, a companhia também é fornecedora de insumos para a pecuária (respondendo pela criação do hormônio de crescimento bovino recombinante) e para a fabricação de comida industrializada (inventando o adoçante artificial sacarina e posteriormente comprando a criadora do aditivo alimentar aspartame).
Posto que fornece subsídios para a produção do que hoje se tornou a base alimentar do planeta,a implantação de campos de sementes transgênicas concentra para a Monsanto os benefícios da produção agrícola ao redor do mundo. Hoje, a transnacional está atrelada a 90% da produção de transgênicos no planeta e líder no mercado de sementes. Esse patamar foi adquirido com a práticas ilegais (ou legais em países com legislações frágeis) e política monopolista no fornecimento de alimentos em todo o mundo, conforme detalhado a seguir.
As sementes a que hoje temos acesso são fruto da biodiversidade de frutas, verduras, legumes e grãos criados espontaneamente pelo desenvolvimento milenar e natural dos organismos vivos. Retirando genes de outros organismos animais ou vegetais e implantando-os em sementes alimentícias, a Monsanto registra a patente deste novo gênero alimentício. Com a ajuda da monocultura, os campos substituíram espécies alimentícias locais pela lista de produtos aceitos pela indústria alimentícia internacional – e a frondosa variedade da qual goza o território brasileiro sucumbe pouco a pouco.
Os agricultores de todo o mundo que adquirem sementes transgênicas assinam um contrato em que se comprometem a repassar para a companhia uma porcentagem do lucro de sua lavoura.
O comprometimento está justificado pelo controle exclusivo sobre as sementes feito pela Monsanto, que produz e adquire as patentes das sementes geneticamente modificadas. Há suspeitas de que o suicídio de centenas de agricultores na Índia esteja relacionado à impossibilidade de saírem do endividamento com a companhia, causado pelos altos custos das sementes e dos insumos químicos necessários à plantação.
Recentemente, a empresa foi processada por centenas de produtores rurais brasileiros que requisitaram a nulidade da cobrança de porcentagem no lucro sobre a plantação de OGM. No entanto, o término do pagamento de royalties não é o único problema em questão. Pois, independente do repasse financeiro, a Monsanto se beneficia contínua e crescentemente das produções agrícolas locais por dois motivos: a dependência do campo e o enfraquecimento do solo.
Para resguardar sua fatia de mercado, a Monsanto tem adquirido recentemente bancos de sementes nativas numa estratégia preventiva frente às constantes investidas populares contrárias à cobrança de royalties pela empresa.Um movimento mundial organiza ativistas para pressionarem os representantes do governo a adicionarem dispositivos às constituições federais, visando preencher “buracos na legislação” que permitem a essas grandes empresas patentearem as variedades de plantas e os métodos tradicionais de produção de alimentos.
Proteção legislativa é o método democrático para garantir a segurança da saúde de consumidores e produtores e da economia da produção agrícola local.
A Monsanto iniciou estudos de sementes terminator (não-germináveis), isto é, que não podem se reproduzir espontaneamente – o que deixaria o produtor rural dependente da encomenda de uma nova leva de sementes a cada nova safra. Segundo Carta Aberta do CEO da Monsanto Robert B. Shapiro, a companhia não pretende e nunca comercializou sementes estéreis. Mas o depoimento de agricultores de todo o país aos movimentos sociais e a contínua encomenda de novas remessas de sementes denuncia que alguma parte desta tecnologia pode ter chegado aos campos brasileiros.
Ainda há que se dizer que a transgenia ameaças as espécies nativas. Algumas espécies de plantas têm cruzamento polinizado, o que significa que o pólen fértil de OGMs pode fecundar outras plantas distantes, transformando plantações próximas também em áreas transgênicas.
Adicionalmente, os agricultores que utilizam suas sementes e se negam a repassar parte de seus lucros, além de serem criminalizados pelos prejuízos financeiros causados à transnacional, contaminam a terra com o cultivo. Isso porque o cultivo de transgênicos está ligado ao uso intensivo de agrotóxicos. O uso de agrotóxicos – que está incluído no “pacote” da plantação de OGM – altera os ciclos naturais do solo e impacta negativamente na retroalimentação mantida pela própria produção de matéria orgânica, responsável pela fertilidade do solo. Mesmo assim, o Brasil é o campeão mundial na importação e no uso de agrotóxicos para o cultivo de alimentos. 85% da soja produzida no país é geneticamente modificada. Hoje, a soja transgênica está presente em 17 estados do Brasil, e a maior produção está no Mato Grosso do Sul, no Paraná e no Rio Grande do Sul.
São dezenas as pesquisas que indicam que consumo de OGM causa doenças. Essa combinação, segundo pesquisas científicas,provoca, em longo prazo (por isso dificilmente mapeáveis), infecções, tumores, câncer, infertilidade, destruição do sistema imunológico, resistência a antibióticos e mutação da flora intestinal.
A informação é pouca divulgada devido à intensa produção de testes patrocinados pela própria Monsanto e à imposição de barreiras a estudos que revelem os impactos dos transgênicos. As pesquisas, em geral, são de curta duração, não registrado impactos negativos nos organismos e influenciando os critérios de biossegurança dos países importadores de sementes OGM. Faltam pesquisas independentes que acompanhem os efeitos a longo prazo dos transgênicos nos organismos vivos. Os poucos estudos que conseguem ser publicados desvencilhando-se da opressão contínua da companhia de biotecnologia sobre os laboratórios de pesquisa ganham pouca visibilidade pela falta de discussão pública sobre o assunto.
Em setembro de 2012, uma pesquisa do francês Gilles-Eric Séralini foi publicada na revista científica Food and Chemical Toxicology, Este foi o estudo mais prolongado até o momento sobre os efeitos da ingestão de milho transgênico da Monsanto NK603, com e sem glifosato (um dos herbicidas mais utilizados no mundo). Os ratos de laboratório alimentados com OGM indicaram propensão radicalmente maior a mortalidade, infertilidade, desenvolvimento de tumores mamários e problemas hipofisários e renais em comparação aos outros animais. O estudo foi fortemente combatido pela companhia com forte resposta à imprensa acerca da falta de credibilidade na equipe de Séralini. Pouco tempo depois, foi admitido no comitê editorial da revista para um cargo recém criado Richard E. Goodman, que trabalhou para a empresa entre 1997 e 2004.
A empresa ainda trabalha contra a rotulagem de alimentos transgênicos. O direito de informação aos consumidores na exigência de discriminação na embalagem de produtos contendo OGM, segundo texto publicado no site da Monsanto no Brasil, “pode prejudicar a confiança dos consumidores” e adicionar um grande ônus às agências regulatórias. Uma série de estudos já revela que o problema da fome está relacionado à má distribuição de alimentos ao redor do mundo – uma consequência da especulação sobre terras e do paradigma econômico sobrepor-se ao bem-estar da população de países com menos condições financeiras. A maior prova de que a biotecnologia não diminuiu o problema, pelo contrário, só dificultou ainda mais o acesso às condições nutritivas mínimas é de que o número de famintos no mundo aumentou. Segundo a FAO, hoje mais de 1 bilhão de pessoas não têm garantido o mínimo de carboidratos necessários à boa nutrição diariamente. Desses, 65% estavam em na Índia, China, República Democrática do Congo, Bangladesh, Indonésia, Paquistão e Etiópia – países localizados em regiões produtoras de grandes estoques de alimentos transgênicos, destinados, principalmente para a engorda de rebanhos bovinos.
O uso de alimentos transgênicos atende um modelo agrícola da monocultura levando, por consequência, ao desmatamento e à contaminação das águas por agrotóxicos. Os latifúndios produtores de um único gênero alimentício têm o solo empobrecimento por desvincularem-no de outras espécies companheiras que poderiam suprir suas necessidades nutritivas. A intensificação da mecanização no campo (forte argumento do agronegócio de grande escala) tem sido uma das principais responsáveis pela fuga da mão-de-obra do campo no país.
Ao redor do mundo, Alemanha, França, Hungria, Rússia, República Tcheca e outros países já se posicionaram contrários à Monsanto e à exploração econômica dos campos por parte de outras multinacionais da biotecnologia. O movimento campesino no Haiti recusou a doação de sementes da Monsanto, depois do terremoto que abalou o país.Frente à forte oposição ativista em países da Europa, a estratégica da companhia norte-americana foi transferir o investimento em países, frágeis financeira e legislativamente, deficitários em qualificação técnica no campo e com abundância de água e de terra para desenvolvimento de latifúndios, tais como China, Índia e os latino-americanos Argentina e Brasil.
Enquanto o estado permanece calado, deixando de promover educação ambiental, melhoria da vida no campo e formação agroecológica, as grandes companhias de biotecnologia investem pesados recursos em meios de comunicação brasileiros, que são demandados para produzirem conteúdo publicitário e favorável ao uso de sementes transgênicas. Os argumentos da Monsanto são de que as sementes de OGM são mais duradouras e independentes de insumos – o que faria da transgenia uma opção sustentável – e que o lucro da propriedade rural é intensificado e o problema da fome diminuído pelo aumento da produção. Como já visto, os argumentos são falsos: os campos ficam dependentes; os seres humanos e animais, contaminados pela ingestão de alimentos geneticamente modificados; a riqueza e biodiversidade, comprometida; e os produtores rurais, reféns da empresa que fornece sementes.
Lutando contra a Monsanto, estamos lutando pela nossa comida. Ao lado dessa, outras empresas compartilham a estratégia antes descrita: Cargill, Syngenta, Bayer e suas filiais no Brasil e no mundo.
Muitos agricultores, consumidores e políticos já são contra a lógica econômica dessas organizações. Uma mudança política pode reverter o quadro e colocar novamente a soberania alimentar e a garantia de um meio ambiente sadio, direitos inalienáveis dos cidadãos, acima dos interesses econômicos de uma empresa de fins privados.
PROPOSTAS
Como sabido, a inclusão de sementes no programa Troca-Troca da EMATER foi uma medida proposta pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (FETAG-RS) e aprovada pelo conselho do Fundo Estadual de Apoio ao Desenvolvimento dos Pequenos Estabelecimentos Rurais (FEAPER). Conforme alertado anteriormente, variados problemas estão relacionados à introdução dos transgênicos nos campos. Os movimentos sociais aqui presentes requerem um posicionamento do estado que possa emitir nova sugestão e retirar as sementes dos campos da agricultura familiar – e, possivelmente, da agricultura de todo o estado.
Para alimentar a população de maneira independente, manter a produção agrícola diversificada e a mão-de-obra no campo,a reposta é investir na soberania alimentar.Nesse sentido, pedimos que o estado adote em seu Plano Estatal de Sustentabilidade o investimento em Bancos de Sementes Crioulas, que valorizem e protejam a biodiversidade local e as alternativas naturais de alimentação.
Neste sábado nos concentramos contra a Monsanto, contra o desnecessário investimento em biotecnologia frente à riqueza nutritiva e econômica natural que nossas sementes crioulas já nos oferecem. No entanto, o desejo e a implantação da transição agroecológica radical acontece todos os dias. Na confiança de um posicionamento firme e pioneiro de nosso governo e no aguardo de respostas imediatas às duas pautas previamente apresentadas, assinam este documento.
Fontes: Sul21 , Burgos Cãogrino , Ihu , La Radio Del Sur