segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Instituto pega dados do TSE e vende na internet informação de eleitores mortos

Com pacotes que custam de R$ 27 a R$ 291, uma entidade do setor funerário vende pela internet acesso a dados compilados pelo Tribunal Superior Eleitoral sobre eleitores falecidos. O fato demonstra que o acordo do tribunal com a Serasa - anulado na sexta-feira, após publicação de reportagem pelo Estado - não foi o único a envolver a liberação de informações sob a guarda da Justiça Eleitoral.

Os dados dos eleitores mortos podem ser pesquisados no site falecidosnobrasil.org.br, administrado pelo Instituto Bem Viver e pela Associação Brasileira de Empresas do Setor de Informações Funerárias. São mais de 13,4 milhões de registros de falecidos.

Quando se faz uma busca por nome ou sobrenome em determinada cidade, a lista de resultados informa a existência de dois cadastros, um do CNF (Cadastro Nacional de Falecidos, organizado pelo próprio site) e outro do TSE. Quando o interessado clica no link "Cadastro do TSE", é informado de que estão "disponíveis" dados como título de eleitor do falecido, zona e seção eleitoral. Mas os dados não são revelados.

Na página de resultados há um link para a "busca avançada" - que só pode ser feita mediante assinatura paga. A reportagem comprou um pacote disponível na internet. Abre-se então a possibilidade de pesquisa por título de eleitor, nome do falecido, nome do pai ou da mãe, cidade ou Estado. A listagem de eleitores mortos só é oferecida pelo próprio site do instituto - não há como ter acesso aos dados pelo site do TSE.

Rotina desde 2008. Maurício Costa, responsável pelo Instituto Bem Viver e pelo site, disse que recebe os dados do TSE, uma vez por ano, desde 2008. A assessoria de imprensa do tribunal não se pronunciou sobre a declaração de Costa, apesar de ter sido procurada pelo Estado no final da tarde de quinta-feira e em repetidas ocasiões na sexta-feira.

A assessoria afirmou apenas que a informação sobre a morte do eleitor não faz parte do chamado cadastro eleitoral, que reúne as informações pessoais do cidadão, e que, portanto, não estaria coberta pelo sigilo.

Advogados ouvidos pela reportagem contestaram essa interpretação e viram no caso semelhanças com o episódio da Serasa. Segundo Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, o TSE não pode colocar a lista à disposição de uma entidade privada, "principalmente se há interesse econômico envolvido". 

"Somente órgãos públicos podem deter essa relação." Mariz disse ainda que "os mortos têm direito à preservação de sua memória", e que a divulgação de seus dados representa "uma violação".

"Discordo de qualquer divulgação de dados pessoais sem anuência das partes e sem controle judicial externo", afirmou o criminalista Rodrigo Bandieri. "Quando o dado é entregue a destino diverso do que deveria, pode até ser alvo de quadrilhas especializadas." Para o advogado Celso Vilardi, mesmo que a lista de óbitos não esteja legalmente coberta por sigilo, é "descabida" sua liberação a terceiros.

Guarda. Maurício Costa mora em Santa Catarina, mas a associação de "informações funerárias" que comanda fica em Brasília, a cerca de 500 metros da antiga sede do TSE. Ele disse ao Estado que seu site não tem fins lucrativos, e que a opção de busca paga só foi incluída na internet há duas semanas. "Prestamos um serviço de utilidade pública", afirmou.

Segundo Costa, que foi candidato a deputado federal pelo PPS em 2010, o TSE não exigiu dele a celebração de nenhum acordo ou convênio para liberar os dados. Não houve registro do fato no Diário Oficial da União. "Apenas faço um requerimento e recebo as informações", explicou.

A lista de eleitores mortos é centralizada pelo TSE, mas o envio dos dados é de responsabilidade dos cartórios. Cabe aos oficiais de Registro Civil encaminhar à Justiça Eleitoral, uma vez por mês, a relação dos óbitos de cidadãos alistáveis, para o cancelamento das inscrições.

Segundo a Arpen, entidade representativa dos cartórios, os dados são fornecidos ao TSE "com o único intuito de estabelecer parâmetros para a elaboração de políticas públicas, e não para ser objeto de negociação, permuta ou comercialização."

FONTE: ESTADÃO
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